domingo, 5 de maio de 2013

A Grande Tristeza


“...a grande tristeza havia pousado nos ombros de Mack como uma capa invisível, mas quase palpável. O peso daquela presença embotava seus olhos e curvava seus ombros. Até os esforços para afastá-la eram exaustivos, como se os braços estivessem costurados nas dobras escuras do desespero que agora, de algum modo, tinha se tornado parte dele. Comia, trabalhava, amava, sonhava e brincava sempre usando essa vestimenta, como se fosse um roupão de chumbo. Andava com dificuldade pela melancolia tenebrosa que sugava a cor de tudo”.  (A CABANA – William P. Young – Sextante, p. 208)

O texto acima descreve como era a vida de Mack após a morte de seu filho. O processo de luto pela perda de um filho é muito particular e envolve exaustivamente muito sofrimento se comparado às demais perdas significativas e se podermos escalonar o sofrimento.No entanto, a perda de um filho quebra o ciclo de vida que conhecemos como natural, ou seja, os pais deveriam morrer antes dos filhos e não ao contrário. Nessa situação de perda de um filho a culpa pode aparecer com muita intensidade. Os questionamentos como “se eu tivesse feito isso ou aquilo” são constantes e muitas vezes impedem que os pais ou cuidadores vivam o processo de luto.

O luto é a reação a uma perda significativa e se desencadeia por aquilo que se ama e já não se tem.

O processo de luto envolve a reorganização da vida e a construção de novos significados para a pessoa enlutada em relação a pessoa que morreu. No caso da perda de um filho esse processo pode ser lento e exaustivo. A Teoria do Apego de Bolwby (1980) está voltada às vicissitudes e alterações dos vínculos no caso de ameaça de separação, separações concretas, nas perdas e no luto. Bowlby sustenta que uma das fases do luto implica na pessoa que sofre a perda, chamar e buscar a pessoa perdida, tentar sem sucesso recuperar a figura perdida. Essa resistência em aceitar a realidade e tentar resgatar o filho morto faz parte do processo de luto e é explicado pelo apego a esta pessoa devido aos vínculos afetivos estabelecidos.

Na fase de busca da pessoa perdida pode haver as seguintes manifestações: movimentos inquietos e exploração do meio; pensar intensamente na pessoa que morreu; perceber a presença da pessoa que morreu; voltar sua atenção a lugares em que há possibilidade de encontrar a pessoa morta e chamar a pessoa que se foi. Portanto, essa fase da busca da pessoa perdida, sem sucesso, faz parte do processo de luto e envolve a questão do apego a essa pessoa e não poderia ser diferente, pois trata-se de um ser humano a quem se ama muito e no caso de um filho, envolve o cuidado, os planos e sonhos idealizados e até o aprendizado de vida e principalmente o sentimento de extensão de si mesmo no outro.

Infelizmente não há atalho para o processo do luto, é preciso passar por ele, é preciso viver a busca da pessoa perdida para saber que ela não voltará. É preciso reconhecer a dor da perda e tentar conviver com ela. Nos casos mais severos como na perda de um filho é possível que a pessoa necessite de um acompanhamento psicoterapêutico para conduzir de maneira mais saudável possível esse momento do luto e assim conseguir reorganizar sua vida.

O afeto, o amor pela filho jamais morrerão, é preciso ter consciência de que o ser biológico morre, mas os sentimentos podem ser ressignificados, ocupar outro espaço na vida de quem perdeu, pois a vida é um constante deixar ir, tudo muda, a vida é mudança. É preciso compreender e aceitar esta condição humana e tentar retirar a vestimenta pesada da culpa.

Textos de apoio: Jornal Actualidad Psicologica – Buenos Aires - Julho de 2012

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