quinta-feira, 16 de julho de 2015

           

O Trem da Partida é o mesmo da Chegada



Alguém partiu. Esta sensação nos envolve quase sem nos deixar respirar. Já não está ao nosso lado. Não importa se já sabíamos disso havia meses ou se sua partida foi desesperadamente repentina...não podemos compreender que já não esteja conosco. Não podemos aceitar que essa pessoa que tanto amávamos e que ainda amamos - porque o amor não se foi com ela - tenha nos deixado...
Tinha tanta coisa para se dizer ainda, tanto para fazer...Se soubéssemos antes; se tivéssemos podido...Não teríamos feito..Esta vivência do irremediável faz com que a dor que nos atravessa a alma seja profunda, infinita, que nos machuque como uma enorme ferida física...

(Se Você Perdeu Alguém que Amava - Edição de Lidia María Riba)



Não estamos prontos para a partida, embora aquela música de Milton Nascimento - Encontros e Despedidas,.nos faça pensar que a hora da partida é a mesma da chegada...."a hora do encontro é também despedida....". Não temos o total entendimento deste rico bordado tecido pela partida e pela chegada e é ele que define nossa vida, vida e morte se entrelaçam, porque viver a morte é viver a vida!!! Algumas pessoas entendem que esta vida é apenas uma passagem, outras que a vida simplesmente acaba com a morte e muitos simplesmente vivem sem a noção exata da finitude, da existência de dois pontos não necessariamente lineares, mas constituídos de uma chegada e uma partida. No momento em que alguém parte refletimos por segundos sobre nossa partida, sobre a partida do outro, do que poderíamos ter feito, se fosse diferente, se pudesse ter sido desta maneira.....
Esta vivência do irremediável, como coloca o texto acima, certamente nos inunda de dor, pois aparentemente nada mais há para fazer! aparentemente.......no entanto há uma uma possibilidade intrínseca nessa relação partida e chegada - chegada e partida: há a possibilidade de novos olhares acerca da vida, do tempo vivido, da qualidade do que foi e está sendo vivido. E o amor que fica? ao amor cabe dar um novo lugar emocional à relação vivida, é um reaprender a viver!E como diz a linda letra de Milton, são só dois lados da mesma viagem....

"São só dois lados
Da mesma viagem
O trem que chega
É o mesmo trem
Da partida..."

(Encontros e Despedidas - Milton Nascimento)

quinta-feira, 21 de maio de 2015





Continuando a Vida - Como se Reposicionar Emocionalmente em relação a Pessoa que Morreu



IV TAREFA DO LUTO



"Ninguém esquece as lembranças de uma relação significativa"





"A disposição da pessoa que ficou viva para entrar em novos relacionamentos depende não de "desistir" do cônjuge falecido, mas de encontrar um lugar adequado para o cônjuge na sua vida psicológica - um local que é importante, mas que deixa espaço para outros" (Shuchter & Zisook, 1986, p. 117). A quarta tarefa do luto está diretamente ligada ao apego. Quando a pessoa enlutada permite que certos comportamentos e falas relacionadas à pessoa falecida, já não têm a mesma necessidade emocional e a representação da pessoa querida que morreu está presente em sua vida de maneira serena e tranquila, sem as angústias maiores do período mais intenso do luto, podemos dizer que a pessoa enlutada encontrou um lugar para quem partiu. Agora ela tem condições de se reposicionar emocionalmente em relação a quem morreu.
Pais enlutados, muitas vezes, têm dificuldade em relocalizar emocionalmente o filho ou a filha que morreu. A tarefa para pais enlutados é continuar a estar em contato com os pensamentos e as lembranças do filho ou filha, porém fazendo isso de forma que permita a eles continuar suas vidas depois dessa perda.
Eis o relato de uma mãe: "Apenas recentemente comecei a observar coisas na vida que ainda estão acessíveis a mim. Você sabe, coisas que me deem prazer. Eu sei que eu vou continuar meu luto por Robbie pelo resto da minha vida e que vou manter sua memória viva. Mas a vida continua, e quer queira, quer não, eu sou parte dela" (Alexy, 1982, p.503).
O melhor movimento para representar a dificuldade para realizar esta tarefa é não amar. Algumas pessoas acham a perda tão dolorosa que fazem um pacto com elas mesmas de nunca mais amar alguém. O apego à perda e tudo que suscitou, impede que a pessoa avance o processo de luto e mais tarde percebe que sua vida, de alguma forma, parou no momento em que a perda ocorreu. Abrir espaço para a vida e para amar outras pessoas e a si mesmo não significa que você deixou de amar a pessoa que morreu, mas que encontrou um lugar emocional para ela. Essa linda e árdua tarefa também exige a elaboração e investigação do grau de autoestima por parte da pessoa enlutada. O exercício do autoconhecimento, não duvidar da capacidade de superação, de ressignificação da dor e da perda, respeitar a si e este momento frágil em sua vida, são elementos essenciais ligados à autoestima e que auxiliam no enfrentamento deste período delicado. Ao encontrarmos um lugar aconchegante, agradável e saudável para esse ser querido, nos libertamos do apego excessivo e nos autorizamos continuar a caminhada.


Referência; Introdução ao Estudo do Luto

quarta-feira, 21 de janeiro de 2015




As Tarefas do Luto - Ajustar-se a um Ambiente onde está Faltando a pessoa que Morreu








"Dê-se a permissão para estar triste e infeliz, para chorar, para estar deprimido por um tempo. Esqueça as proibições de chorar, de sentir-se abatido. Busque as pessoas sábias que possam entender sua situação. Com o apoio necessário, se você expressar seus sentimentos íntimos, estará começando a superar sua tristeza"Jean Monbourquette



A terceira tarefa do luto consiste em aprender a viver sem a presença da pessoa que partiu e principalmente, desempenhar papéis que eram destinados a esta pessoa. Esta adaptação à nova realidade reque ajustes a um novo ambiente e está diretamente ligada ao tipo de relação vivida com esta pessoa, quer seja, marido, filha, amiga, etc. 
Muitas pessoas que ficam, os sobreviventes, se ressentem do fato de terem que desenvolver novas tarefas e de desempenhar papéis que antes eram realizados por quem partiu. Redefinir a perda, assumindo tarefas e papéis que eram da pessoa que morreu, atribuindo a essa mudança um possível benefício para a pessoa que ficou, indica a execução completa da terceira tarefa do luto, mas nem sempre isso é possível, pois o momento do luto nos coloca diante de nossas fragilidades e as vulnerabilidades veem à superfície nesse período.
Portanto, o luto pode levar a uma intensa regressão na qual a pessoa enlutada percebe a si mesma como desamparada, inadequada, incapaz, infantil ou com crise de personalidade (Horowitz et al.,1908) e as tentativas de assumir os papéis da pessoa que morreu podem não acontecer de forma efetiva, desencadeando o sentimento de baixa autoestima.Nesse período a pessoa atribui este sentimento de inadequação à má sorte ou ao destino, menosprezando a sua própria força e habilidade (Goalder, 1985). No entanto, com o caminhar diário, revestido de muita paciência e perseverança, as imagens negativas cedem lugar a outras mais positivas, assim é possível o aprendizado de novas formas de lidar com o mundo (Shuchter & Zisook, 1986).
Nesse processo de ajustar-se ao ambiente a pessoa enlutada pode sentir que perdeu a direção na vida e até a perda da identidade, como no caso dos relacionamentos em que se perde o sentimento de individualidade. Nesses casos, a perda por morte pode desafiar os valores fundamentais da vida, bem como as crenças que são influenciadas por nossos familiares, iguais, pela educação, pela religião e envolve as experiências de vida. Nos casos de mortes súbitas ou precoces, a pessoa que ficou procura significados na perda, sua vida muda para dar sentido a esta perda e para obter o controle de sua vida. Nessa fase do luto há um confronto direto com inúmeras perguntas a respeito da morte do ente querido e, muitas vezes, tem que se aprender a viver sem as respostas.
O principal entrave desta tarefa é não se adaptar à perda. As pessoas trabalham contra elas mesmas promovendo seu próprio desamparo ao não desenvolverem habilidades das quais necessitam, muitas se retiram do mundo e não enfrentam as exigências do ambiente. Bowlby (1980, p.139) afirma que, "dependendo da forma como ela completa esta tarefa, influenciará o resultado do seu luto, tanto num progresso em direção ao reconhecimento da modificação das circunstâncias, uma revisão de seus modelos de representação e uma redefinição de seus objetivos na vida, ou ainda um estado de crescimento suspenso, no qual ele é mantido prisioneiro de um dilema que ele não consegue solucionar".
Esta tarefa do luto é crucial na vida do enlutado, coloca-o diante de questionamentos e de enfrentamentos diários, levando à revisão de valores e convidando a mudanças pessoais, às vezes bem profundas, exigidas pelo ambiente e pela nova realidade posta.Podemos denominar esta fase como de transição, onde o desapego se faz necessário e a descoberta de um novo lugar para pessoa que morreu em nossas vidas,se mostra no horizonte.

Fonte: Introdução ao Estudo do Luto